Quase
duas da manhã e eu para aqui, nisto. A esperar que o tempo traga o sono que
hei-de dormir.
sexta-feira, 31 de janeiro de 2014
segunda-feira, 27 de janeiro de 2014
pagar e andar
Tantas vezes aqui chego com uma ideia na cabeça e me
acontece, ao lançar a mão sobre o papel,
ela fugir-me, indomável, para destinos imprevistos, que optei por deixar de eleger
assim os temas sobre os quais escrevo.
Passei a escolhê-los como fazem as
prostitutas com os clientes, ou seja, todos servem. Dito isto, não haverá pois
da parte dos meus (dois) leitores, lugar a indignações ou outras repulsas.
Ficam avisados que o espectáculo pode ser tão
degradante quanto denunciador da indigência mental do autor. É ‘pagar’ comer e
andar.
sábado, 25 de janeiro de 2014
tudo o que é feio me encanta
Os clientes são sempre os mesmos. Entre eles eu. As cinco
pequenas mesas quase se tocam de tão próximas que estão. Alinhadas por um
critério espacial cujo único objectivo é assegurar que todos ficaremos
apertados por igual. E ficamos, de facto. A televisão, junto ao tecto, com o volume duas oitavas acima do máximo,
está tão mal sintonizada que fico sempre sem perceber onde chove mais
abundantemente, se lá fora na rua ou aqui no seu ecrã. Os jornais exaustivamente manipulados estão empilhados
sobre a arca dos gelados. Ali ao canto, mesmo à porta da casa-de-banho, um
enorme amontoado de caixas vazias, um
barril de cerveja, dois volumes de toalhas
de mesa, ainda por usar, e três chapéus de sol, ao alto, ferrugentos e fechados. Fechado está também o forno dos croissants, há
muito convertido em móvel dos sobejos. É lá que são arrumados os inúteis. E
os detergentes também. No interior do
balcão-vitrine há uma pilha de diversos, imunes ao tempo, repartindo espaço com
as latas da Pepsi, os néctares, as águas, os Bongos e um prato onde o bolo de
bolacha está perto do fim. Na prateleira de cima, em três
tabuleiros adjacentes à caixa de cartão onde se acumulam as contas por
pagar e as facturas do mês, um queque e um bolo de arroz, duas bolas de Berlim
e três bolinhos de amêndoa. Daqueles do Algarve, que eu era capaz de jurar já ali
estarem desde o Natal. Por entre os escassos centímetros de montra disponíveis,
tal a quantidade de cartazes colados no vidro, reparo que deixou de chover lá
fora. Porém, na televisão continuam os aguaceiros. É assim a tasca onde almoço diariamente. Onde
o encanto por tudo o que é feio exerce sobre mim a mesma atracção que um
restaurante de cozinha de autor desempenha sobre qualquer gourmet que se preze.
Num dos editais afixados no seu interior reparei que a classificação que lhe é
dada é de ‘casa-de-pasto’. Enternece-me ainda mais o espaço, agora. Talvez por sabê-lo assim, honrosamente digno
de tão apropriada designação.
quinta-feira, 23 de janeiro de 2014
Porquê? Por maldade, claro.
O quadro pinta-se assim: à mesa do restaurante, no espaço
onde decorre o evento, o fotógrafo (maldoso, só pode) registou o momento. As
duas, lado a lado, sorrindo para a objectiva (quanta objectividade senhores!) a
aguardar o milagroso click.
Mais tarde,
talvez já sob o efeito do engano que o escuro da noite facilita, havia o
retratista de difundir a imagem, num desses instrumentos perfeitos para criar
ilusões, onde se postam toda a espécie de inconveniências e de ‘esquizofrenias
mediáticas’.
Até aqui nada de mais. Afinal é a idade, essa demolidora de
fisionomias, que faz de todos nós os feios e as feias em que nos tornamos. A
diferença está (estará?) na cegueira que nos tolhe. Na treva que nos veda o
acesso a essa e outras dolorosas verdades. Houve até quem já o tivesse dito de
outra forma, não menos pungente: «Com a idade todos ficamos respeitáveis, as
prostitutas e os prédios feios também.»
Mas, de volta à pintura, lá estavam as duas, coitadas,
naquele ar de desamparo, achando-se belas, em todo o seu esplendor. Porém,
feias como uma noite de trovões. À espera do pior, que, tenho a certeza, estava
atrasado e ainda por vir. Mas veio. Chegou sob a forma de amiga. Vestida na sua
pele exausta de sol, as narinas dilatadas, os poros na testa e nariz
pontilhados de creme, a falta do molar superior a fazer-se notar. Chegou e
disse, mesmo por baixo da foto, em jeito de comentário daqueles que se fazem
sem deixar lugar a dúvidas: LINDAS!
E eu, mais feio ainda, li aquilo e não retive o sorriso
cândido com que sempre acolho a maldade.
quarta-feira, 22 de janeiro de 2014
(des)interesses
Revejo-me na opinião do JRC
sobre‘amigos’. Mais
ainda por que lê-lo me traz à memória alguns que me atravessaram a vida.
Poucos. Uns, que me deixaram vagamente desapontado, outros, que nem isso.
Verdade se diga não mais que meia dúzia sobreviveu ao tempo. E desses, quase
nenhum vindo das verduras da adolescência. Destaque mesmo, merecem os que me
surpreenderam, não pela merda (leia-se, fraude) de pessoas que eram, mas pela
forma virtuosa e sã de nada esperar em troca do que traziam. Dois ou três. Não
houve mais. Diverte-me, no entanto, que tantos pensem caber nesse
reduzido número. Como se, na sua opinião, a amizade fosse isso, de não saberem
sequer de que males padecem e onde apertam as necessidades dos que julgam ter
como amigos. O pior (pior mesmo) é que a amizade não é um serviço. Talvez por
isso, às vezes, a simpatia pareça amizade. Talvez por isso, se possam
enganar algumas pessoas durante todo o tempo, e todas as pessoas durante algum
tempo. Agora, o que não é nada fácil é enganar todas as pessoas o tempo todo.
avô
Ontem fez anos que morreu o meu
avô. Era um homem do caraças. Sinto saudades dele, levemente atenuadas pelo
relógio ali em cima do móvel. Herança que me coube em sorte, entre outras. Este
feitio, por exemplo. O vazio que me enche à noite. O jeito para engraxar
sapatos. O uso desse adoçante que é o optimismo. O talento estético. O gosto
pela fantasia. Tenho um ADN extraído de ti, avô. Ainda assim gostava de ter
herdado outros engenhos teus. A paciência. O teu carinho e simpatia feitos de
pequenos gestos. A coragem e a força. Aquele teu lado generoso. Esmero-me mas
não te alcanço. Fico para aqui a cochichar lamentos e pouco mais. A recordar
como parecias ter orgulho em mim. Logo eu que tão poucos motivos te dei. O
bolor a entranhar-se na memória e tu cada vez mais distante. O que me resta é
pouco. O teu relógio ali parado. Um livrito que escreveste. Enfim, quase me
sinto reconhecido a estes objectos por estarem aqui comigo, ajudando-me a
recordar-te. Pequenas coisas que nos aproximam encurtando a distância que nos
separa.
terça-feira, 21 de janeiro de 2014
a roçar a excelência
Raramente se junta assim tanta qualidade; poema, música, video, interpretações.
Eu que me comovo
Por tudo e por nada
Deixei-te parada
Na berma da estrada
Usei o teu corpo
Paguei o teu preço
Esqueci o teu nome
Limpei-me com o lenço
Olhei-te a cintura
De pé no alcatrão
Levantei-te as saias
Deitei-te no banco
Num bosque de faias
De mala na mão
Nem sequer falaste
Nem sequer beijaste
Nem sequer gemeste,
Mordeste, abraçaste
Quinhentos escudos
Foi o que disseste
Tinhas quinze anos
Dezasseis, dezassete
Cheiravas a mato
À sopa dos pobres
A infância sem quarto
A suor, a chiclete
Saíste do carro
Alisando a blusa
Espiei da janela
Rosto de aguarela
Coxa em semifusa
Soltei o travão
Voltei para casa
De chaves na mão
Sobrancelha em asa
Disse: fiz serão
Ao filho e à mulher
Repeti a fruta
Acabei a ceia
Larguei o talher
Estendi-me na cama
De ouvido à escuta
E perna cruzada
Que de olhos em chama
Só tinha na ideia
Teu corpo parado
Na berma da estrada
Eu que me comovo
Por tudo e por nada
segunda-feira, 20 de janeiro de 2014
o que tenho de sobra
Ligado à máquina vou afinando a mão.
Terá ela afinamento? Vou burilando a
pedra do saber até que nela se consiga perceber a escrita. Não será isso
ambição a mais? (Talvez, logo se vê.) Um ano ou dois, já houve alturas em que três,
e entrego-o ao abandono. Como quem tem pela frente um deserto a atravessar. Um
desvio de nada. Uma saída de estrada. Para depois, já amanhã ou daqui uns
meses, sei lá, retomar a viagem por outras letras. Afinando a mão de novo. Satisfazendo
o que tenho de sobra. Necessidade. Desprezando o que tenho a menos. Aptidão.
sábado, 18 de janeiro de 2014
a verdade da mentira
Todos os dias, logo ao
alvorecer, nos beijam com ufanas notícias de que estamos a emergir da garantida
desgraça em que vamos estar a viver amanhã.
Em suma: vivem-se tempos
em que, recuando dia após dia, nos dizem que estamos a avançar.
quinta-feira, 16 de janeiro de 2014
coadopção
Poupando-me o tempo de aqui dizer o que penso, encontro aqui boa parte do que reproduz a minha opinião sobre o assunto.
A acrescer só mesmo o facto de achar que se verifica na forma intolerante como os gays desrespeitam as opiniões que lhe são contrárias, um acessório de razão para considerar que a luta pela entrega de uma criança, de todas as crianças, que se trava assim, evidencia o que fica óbvio: esse modelo de argumentação (mais feito de má-fé e fundamentalismo) nem com animais de estimação seria aceitável.
quarta-feira, 8 de janeiro de 2014
o inferno servido em bandeja cintilante
Assim
como quem não quer dizer o que diz, ouvi-lhe eu, dirigindo-se ao seu
interlocutor , que ‘aquilo também não havia de ser nada de especial’.
‘Que diabo!’ acrescentou no final, com exclamação
e tudo.
Foi então aí que eu lhe dei razão. De facto,
não andava longe da verdade, a coisa não era mesmo nada de especial.
Eu
diria até mais, que assim de memória não me lembro de alguém a quem tivesse
parecido ser árdua a tarefa, quando olhada assim, de longe e de viés.
Depois,
não muito depois, é que a faina lhes tira o sono. E tira-lhes tudo o resto. A
paz, o tempo, a serenidade. Tudo. Dia
após dia, num tormento que não alivia, que não cessa de crescer. Deita-se e acorda
connosco. Numa fidelidade que parece mentira.
Então
sim, então é que o ofício ganha relevo. É nessa altura, por vezes já tarde demais,
que a frase se reformula: ‘aquilo também
não é nada de especial, se for feito por quem saiba, que diabo!’
E
o pior é isso mesmo. É que não será.
domingo, 5 de janeiro de 2014
linguagem encriptada (by Santiago)
Utá? (Onde está?)
Pelalá ( Espera lá)
Pela (Espera)
àpanha (Correr ou
fugir)
U ão? (O João?)
A bó? (A avó?)
Bia (Avó)
Rande (Grande)
Pucanino (Pequenino)
Ulálá (Música)
Majato (Mais alto!)
Não Koka (Não toca; referindo-se ao rádio desligado)
Não Koka (Não toca; referindo-se ao rádio desligado)
Majáto (Mais alto; pedindo que se aumente o volume)
Fé (Café)
Diga-se o que se disser percebe-se que a criança aprecia o degustar da palavra.
o preço a pagar pela vil tristeza da imitação
Hesito, não sei se compre o iphone!? Bom, na verdade não haverá lugar a muitas
dúvidas, pois, como poderei eu fazer chamadas, enviar sms’s, usar a internet e
tirar fotos ou fazer vídeos, sem ele? A questão talvez se ponha antes no que à
compra do tablet diz respeito. Porém, parece-me também não ser coisa que permita
indecisão. Afinal, como poderei eu fazer chamadas, enviar sms’s, usar a
internet e tirar fotos ou fazer vídeos, sem ele. Realmente, onde por certo
residirá a incerteza é na compra do portátil; é que, bem vistas as coisas, como
poderei eu tirar partido da sua mobilidade quando quiser fazer chamadas, enviar
sms’s, usar a internet e tirar fotos ou fazer vídeos, sem ele? Com efeito, o
que efectivamente me suscita reservas é se
ainda precisarei do desktop PC. De facto, já só o uso para fazer chamadas,
enviar sms’s, ir à internet e tirar fotos ou fazer vídeos, parece-me assim que
talvez possa agora prescindir dele. De alguma forma dispensá-lo revelar-se-à uma opção acertada pois sempre me livro dos 3 teclados (dois deles sem fios),
dos quatro ratos, das duas câmaras, dos 3 discos externos, dos dois pares de colunas e também das 2 impressoras, já que fico
apenas com a de laser para o que der e vier. Ah, já me esquecia, talvez considere
ainda o ensejo de na mesma oportunidade me livrar também do notebook que já não
uso nas viagens e com ele, dos outros 3 telemóveis, dos 2 smartphones, das 4
máquinas fotográficas e também da câmara de vídeo.
Ufff! Que coisa esta, tão exigente a vida quando uma pessoa tanto se constrange
para ter tudo o que precisa, cheio de funções que nunca usará, apenas para parecer aquilo
que nunca será. Xiça!
sexta-feira, 3 de janeiro de 2014
para onde aponta o futuro - 2º acto
Repetição e canseira num aranzel mais monótono que o cair da chuva (daquela
que chateia mais do que molha) lá fora. Futilidades a contendo extraídas quase
todas das notícias do dia, dos suportes do costume. Um reler o já lido que mal
seduz até pela pobreza da opinião acrescida. Uma temperatura morna que não
engravida o interesse de ninguém, de resto, como se tem vindo a concluir nos
contadores que ali instalou para numerar seguidores. No fundo sente-se o
passado a consumir o futuro que a falta de imaginação não promete. Já se quer
ao menos que mudasse o gosto pelo que lê. Mas não. Mais do mesmo, que sendo já
mau piora ao mudar de sítio. É só por isso que, cansado de lá ir em vão, vezes
sem conta, eu me disponho agora a por lá passar só quando o rei faz anos (data
que por sinal me escapa). Afinal nem sempre escrever bem é suficiente para nos
atrair à leitura. Aliás, eu diria mesmo que nunca será bastante.
(Cai o pano.)
quinta-feira, 2 de janeiro de 2014
o que lhe vem do passado - 1º acto
Uma certa sobranceria de quem se acha acima. Um eleger protagonismos
feito sobre o preconceito da visibilidade de que se acha trajado. Paralelas a
este cenho (imitação de intelectual), cuja origem se esforça por esconder, corre a
notoriedade que lhe é conferida pelo cargo. E, se em terra de cegos (enfim,
vocês sabem…), o resultado final é que lhe falta em humildade o que sobra das
frustrações que a infância sulcou. E não devia.
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