Não é
de arrepiar a paisagem, nem o local fica sequer a dever à beleza que nos toca
nos sítios belos que retemos. É um lugar perto de tudo tal como de tudo é
distante. Um pedaço de nada a céu aberto. Um torrão do que se queira ali
criado. Ar puro, no pé da serra, soalheiro quanto baste, ventoso
quando a aragem cresce em rajada, uma estiagem das mais férteis no tempo que
resta. No entanto, se méritos daqui ainda não lhe sobram, valores também não
lhe faltam. De tal sorte que, se do oásis de paz, ou até mesmo de tudo o
que ali é quietude, eu tivesse de falar para dizer do merecimento do local,
mais não faria do que aflorar de leve o que aquele sítio tem de valioso. Ainda
assim (não há nada mais triste que o imerecido desencanto) por ali vive
quem não sonhe com outra coisa que não seja partir. Fugir em debandada deixando
para trás tudo o que a visão ignora quando se empenha em não ver o que está à
frente dos olhos.
Privação
podemos tê-la sem a querer, voluntariosa como sabemos que vem aquela que se
instala sem cerimónia. Assim se hospeda tantas vezes na nossa vida de onde não
sai por nada. Nada, aliás, é o que podem fazer, se não conste que a alcancem ou
facilmente dela se livrem, aqueles que a sorte deserdou . Contudo,
ambição cega, essa só nos cabe a que assumimos e acolhemos. E, mesmo quando a
cegueira nos faz definhar sob o pano de fundo da mais deprimente vida. Mesmo
quando escondemos por detrás do mais insano desinteresse a vontade (ou a
apetência) em fazer algo pela vida. Algo de útil, que nos dê sustento e
equilíbrio, senão do corpo que seja do espírito; algo que nos afaste do
desacerto, do engano e da trapaça que é a vida que levamos. Pouco crédito nos
sobra quando assim nos damos por vítimas do mais fútil viver. Fazendo dos dias
um repetido sonho de ter o que não temos, fazendo do tempo um eterno pedir como
se o segredo daquele inferno estivesse em darem-nos o que talvez nem precisemos
ou nunca seríamos capazes de governar – uma razão de viver.
(Retrato
de algumas vidas que observo. Gente que esbanja anos de existência encerrada
entre paredes de mentira e ilusão. Dizendo-se infeliz por não ter o que
gostava, descontente por não ser o que não é, mas incapaz de estar mais
que umas semanas num emprego, escudada nas mais absurdas desculpas: é
cansativo, ganha-se pouco, não me dão o justo valor, queria melhor que aquilo.
Definham
de tristeza os que escolheram por vida ser inúteis reclamantes, ignorando os
que a seu lado, com bem menos, são felizes, saudáveis e bem sucedidos. Crescem
na dignidade aqueles que aceitam as desventuras como elas os colhem e as moldam
na fortuna que os faz bem viver com o pouco que começaram por ter.
Mortificam-se e adoecem de tortura os se levantam, comem e dormem,
dizendo-se infelizes nos intervalos, sonhando com um destino a que, indolentes,
não se dispõem NUNCA a meter mãos.)
Sem comentários:
Enviar um comentário